domingo, 22 de novembro de 2015

Distopia e utopia

Conhecer a si mesmo, a mais extraordinária experiência. Também a mais difícil, eu diria. Porque o autoconhecimento demanda a autodestruição. Como num sistema cartesiano, analisar-se significa desmontar-se, como um relógio, peça à peça, isolando-as e estudando-as para, por fim, compreender o todo.

A desconstrução é lenta, dolorosa. As engrenagens do pensamento estão acostumadas a girar num sentido, num mesmo ritmo, há tempos. Isto quando não estão enferrujadas ou danificadas. A imagem que projetamos de nós mesmos quase sempre corresponde à idealidade, não à realidade. Busco o equilíbrio na fenomenologia, no clonazepam e na esperança de conseguir, um dia, compreender todas as partes deste meu ser, neste tempo.

A esperança, faca de dois gumes, me leva a crer, além da desconstrução e da compreensão, na reconstrução. Em um novo eu. Em alguém livre dos medos, dos remédios e dos pre-conceitos. Em alguém leve e feliz. Em ser o projeto das minhas escolhas, Em ser, realmente, meu. Em ser e estar, existir e viver. Em ver e enxergar, escutar e ouvir, pensar e criar.

Mas são tantas engrenagens, parafusos e ponteiros...

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Crux Ansata

Não saberia precisar desde quando. Semanas, meses, anos... estou morto, em vida. Um processo lento e contínuo que envolve autoconhecimento e autodestruição. Obsolescência programada por um coquetel de medicamentos que me levou de mim.

De quem são essas reflexões vazias, que se assemelham à sentimentos distantes, que as vivo quase que em terceira pessoa? E onde estou eu, em meio à tudo isto? Deitado, na cama, sob efeito de alguma droga, indiferente?

Estar e não ser. Não ser mais quem era, de bom ou ruim. Morrer por completo para, quem sabe, um dia renascer. Diferente? O mesmo? Ou permanecer morto? A árvore, no meu desenho, estava seca. Mas continuam me regando, com bromidrato de citalopram e clonazepam. Ah, e água, é claro.

Que o sol possa fazer o seu trabalho.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Asilo

Como é que somos capazes de, sem tirar a vida, matar uma pessoa? Sinto uma tristeza vazia, sedada, irreal. Sinto essa tristeza longe, como se não pertencesse à mim. Ela se projeta, ao meu lado e eu a vejo como minha, mas não a vejo em mim. Sinto-me impotente para sentir. Queria ser capaz de chorar. Ser capaz de gritar. Ser capaz de discordar. Mas só sou capaz e assentir e imaginar  todos os sentimentos que estaria vivenciando, se estivesse são.

Eu sentiria muito, se sentisse.


segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Diário

Pensei em escrever. As ideias, abundantes, fluem, insanas. Mas em meio a esse caos, é impossível. Não consigo me concentrar. Muitas vozes, sons, barulhos, gargalhadas, buzinas e gritos se confundem numa mistura caótica. Busco encontrar, dentro de mim, um pouco de paz e concentração, mas é em vão. Essa baderna me impõe limites.

Destaco da cartela um Rivotril. Dois.

Observo, inerte, a tela da tv desligada. Aos poucos, os sons vão diminuindo. As vozes vão se acalmando, até se calarem. As gargalhadas desaparecem, junto com o eco distante das buzinas e  dos gritos. Estão todos agora apenas na memória. Silêncio, enfim. 

Mas as ideias... onde estão as ideias? Onde está a inspiração? Elas se foram, de mãos dadas com o caos. Deveria me sentir frustrado, triste. Indiferente, me deito e penso: tanto faz. Amanhã será um novo dia. 

Mas isto aconteceu ontem. E antes de ontem. E hoje.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Empatia

"Antes que os olhos possam ver, é necessário que tenham perdido a capacidade de chorar".

Eu perdi a minha capacidade... de ver.

Ou então, nunca fui capaz de ver e, o que via eram frutos dos meus sonhos, da minha imaginação, do meu mais sincero ideal.

Ou, se a vida sabe ser cruel, tudo que eu eu vi eram tão somente as visões de terceiros que, sem me dar conta, tomei como minhas, as vivi e hoje descobri que eram apenas uma ilusão. Eram vazias.

Não sei. Só sei que me vejo no escuro, tateando desesperadamente por um interruptor. 

Eu sinto muito

Eu sinto muito. Eu sinto demais. Não vivo mais num mundo racional, onde há equilíbrio entre a mente e o corpo. Eu não penso, apenas... sinto.

Sinto um vazio no peito, angustiante, que me faz perder o fôlego, perder o ar. Sinto uma vontade imensa de correr, gritar. Sinto saudades do silêncio em minha mente, das ideias que fluíam. Sinto uma dor no peito, um formigamento nos braços, a morte eminente. Sinto um calafrio correr minha espinha e a súbita sensação de que o sangue explodirá em minhas veias cerebrais.

Sinto frio e fome, neste verão castigante e a mesa farta. Sinto o mundo desabar sobre os meus ombros, enquanto sinto impotência, inerte em meus pensamentos, vazios e solitários. Que mundo é este? Onde está a empatia? Onde está a humanidade?

Sinto medo. Medo de estar em um labirinto, preso dentro de mim, e de nunca mais encontrar a saída.

A única coisa que não sinto mais é vontade de continuar vivendo desta forma, pelo menos não neste mundo. Pessoas, máquinas, objetos... insumos. É... é pavor.