terça-feira, 29 de junho de 2010

Pretérito presente

Surpreendo-me, às vezes, relendo as palavras que escrevi no passado, recente ou remoto. Não se trata, no entanto, de concordar ou discordar, se arrepender ou reforçar determinadas idéias. Nada mais do que observação passiva, digestão, ruminação, amadurecimento ou simples análise do contexto ao qual tal idéia fora forjada.

Surpreendi-me, como ressaltei no parágrafo anterior. E agora? Parágrafo novo, vida nova. Tempo é sempre uma constante nas minhas divagações absurdas. Fascina-me o modo como ele interfere em nossas vidas, mesmo que não possamos compreendê-lo em sua essência, dominar sua natureza ou manipulá-lo à nosso bel prazer.

O tempo, nosso maior aliado, nosso maior inimigo. Alguém que nunca poderemos derrotar.

O passado é repleto de história, de erros e acertos. De mistérios, curiosidades, monstruosidades, aberrações, fatos heróicos e vergonha. O futuro... ah, o futuro! Uma incógnita, um mistério cheio de esperanças, é claro. Esteja ele escrito pelo destino ou em construção pelos atos presentes e passados que interligam todos os entes deste universo.

E o presente? Nunca pensei ter dúvidas sobre o presente. O presente vive-se.

Disse no início deste texto que me surpreendia. Sim, estamos a quatro parágrafos de tempo daquele instante. “Disse”. Pretérito perfeito. Será que essa nova medida de tempo, parágrafos, permite-nos afirmar que a primeira linha desta cártula pertence ao passado?

Digas, então, o que pertence ao presente? Cada parágrafo, frase ou palavra dita, antes mesmo de concluída, pertence ao passado. Cada sílaba concluída, antes mesmo de proferir uma nova palavra, já pertence ao pretérito. Que é o presente, senão um eterno passado recente? Que lapso de tempo pertence ao presente? Uma hora, um minuto, um segundo? Agora? Pronto, passado.

Ora... diria, mas não, está dito. Fora dito. Não me pertence mais. Cada frase deste texto, cada parágrafo desta divagação. Posso me arrepender, posso reformulá-la, posso corrigi-la. Somente enquanto dure o processo de criação. Mas aqui e agora, impresso e em tuas mãos, ou visível em reluzentes telas de computador... representam apenas passado.

Um passado onde gastei um tempo que um dia fora presente, cujo lapso escorre por entre meus dedos como a areia escapa à ampulheta. Um passado onde cada palavra lida representa o que se foi, e as que virão, no futuro, se farão presente e pretérito sem que percebas disto. Viste?

O presente é agora. Não esta primeira oração deste parágrafo conclusivo. Ela já pertence ao passado. Este texto é pretérito. Sua consciência, agora, é o presente. Sua lembrança o passado e sua dúvida, o futuro.

Escrito em 11 de janeiro de 2007.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Palavras

Tenho muitas PALAVRAS para compartilhar, mas não sei por onde começar. Afinal, são apenas algumas palavras. Apenas?

Palavras não são apenas “palavras”. As palavras são um pequeno sopro sonoro da nossa alma, que expomos ao mundo, revelando a intimidade da nossa consciência, o segredo dos nossos pensamentos.

As palavras são como flechas, que armamos e disparamos contra alvos (in)determináveis. E como as setas, podem ferir, podem lacerar, podem tornar irreversíveis alguns dos mais humanos sentimentos.

Mas as palavras também podem curar. Podem remediar. Podem fazer-nos heróis, ou covardes. Adjetivos, e adjetivos são palavras, palavras que escolhemos ser. Locuções verbais, sujeitos e predicados. Somos objetos da palavra, ora diretos, ora indiretos.

Palavras empilhadas fazem prosa, palavras selecionadas poesia. Meros Verbetes? Vocábulos a esmo? Não, não as palavras.

As palavras possuem classe, possuem estirpe. Outras são a escória. O que diferencia a expressão “prostituta” da “puta”, essa meretriz do dicionário culto?

Palavras são marginalizadas, literalmente e com direito à pleonasmo. Vejam o preto, primo pobre, vil e desprezível do negro. As palavras carregam quase que com vida própria, suas próprias significações. Nossas significações, nossos sentidos. Quem disse ao negro que preto era crime?

E o preciosismo, sem valor – que se diga – dos excessos de alguns literatos, advogados e jornalistas? Maltratam-nas, expondo-as indelicadamente, como servas à sua vontade, castigando-as para satisfazer o ego déspota de seus locatários. Tratam-na como se não precisasse de carinho, como se sua beleza individual ofuscasse a falta de criatividade crônica daqueles que se julgam tão... poetas.

Buscam-na, às vezes, em outras culturas, em outros povos, em outras línguas, e as expõem, nuas e cruas, em meio ao vernáculo, deixando-as perdidas, solitárias em meio às muitas outras palavras.

Palavras cantam a beleza do mundo, declaram guerras. Palavras punem crianças, adornam lápides, enaltecem as mulheres. Palavras escrevem a história, palavras entram para a história. Palavras são a história, pois antes da palavra, sequer havia história. Quantas palavras repetidas... Afinal, que palavras são inéditas?

Que palavras dizer, em sã consciência, que o subconsciente, sujeito oculto, às vezes indeterminado, é louco, doido varrido?

Palavras, mais que palavras. Transmitem nossa personalidade, revelam um pouco do nosso caráter. Alguns defendem a palavra a até a morte. Outros, gênios da verborreia, não tem sequer palavra.

É, palavras não são apenas palavras.