Todos os dias, morremos um pouco. Seria clichê apelar para a biologia e demonstrar que pequenas parcelas vivas, palpáveis do nosso ser, se vão todos os dias. Há, claro, a renovação celular. Mas o certo é que, com o passar do tempo, nossos tecidos se vão mais rápido que do que se regeneram, envelhecemos e, por fim, morremos.
Estar vivo é isto; morrer aos poucos. Uma morte lenta, gradual, certeira, impossível de ser impedida. E, enquanto estamos vivos, estamos fadados também à uma outra forma de morte; a morte dos nossos entes e amigos queridos.
A verdade, nua e crua, é que, ou se enterra, ou se é enterrado.
Sobreviver, morrendo aos poucos. Morrendo a própria morte e suportando a morte dos que amamos. Quanto mais se vive, mais se morre; mais se enterra seus amores, mais se vê padecendo, aos poucos. Quando chegamos aos nossos 80, 90 ou mesmo 100 anos, já perdemos tantas pessoas, tantos amores quantas células, órgãos ou tecidos.
Eu me sinto triste. Mas é uma tristeza estranha, vivida em terceira pessoa. Olho-me a mim mesmo com uma certa indiferença que me faz ter vergonha da forma que me porto, sedado, incapaz de gritar, de chorar, de dizer 'eu te amo', te dizer 'adeus'.
Quando morrermos, apenas concluímos um ciclo de morte que se iniciou logo no dia em que nascemos.